O Brasil precisa crescer com qualidade, e, para isso, dependerá da política de estabilidade de preços conjugada com redução contínua do custo real do capital e da produção, do aumento dos investimentos em infraestrutura e da competitividade industrial.
O aumento de preços da economia brasileira está atrelado a vários fatores inter-relacionados: oferta e demanda agregadas, e institucional.
No ano passado, a queda da produção de grãos no mundo, conjugada com a seca nos Estados Unidos e redução dos estoques em todo o planeta, acelerou o aumento de preços. Neste ano, a situação inverteu-se. A produção brasileira de grãos, frutas e verduras será maior. Para a produção de grãos, prevê-se uma colheita recorde de 184 milhões de toneladas, um aumento de 11%, com reflexos na queda dos preços agrícolas a partir dos meses de maio-junho próximos.
Com relação aos produtos industriais, há uma limitação de oferta, não pela falta da capacidade da produção efetiva instalada na indústria, mas pela preferência dos consumidores por produtos importados, mais baratos. Com o câmbio valorizado, o preço dos importados tornou-se mais competitivo que o dos nacionais. Isso tem afetado, por exemplo, a produção dos setores têxtil e eletroeletrônico.
No que diz respeito à demanda, a política econômica de crescimento com inclusão social reduziu a informalidade e incorporou ao mercado de trabalho e de consumo mais de 40 milhões de pessoas, ou seja, quatro vezes a população de Portugal. Isso ocorreu ao longo dos últimos 10 anos, provocando aumento na demanda por bens e serviços: tivemos um choque de demanda.
Há um componente institucional no aumento da demanda por bens e serviços: a regra do salário mínimo. O critério de ajuste do salário mínimo é incompatível com a estabilidade de preços e com a produtividade do setor industrial. Ele eleva o custo das empresas de modo linear, prejudicando os menos competitivos. No ano passado, o produto nacional cresceu 0,87%, e o ajuste do salário mínimo foi de 14,12 %. Esse aumento desproporcional é mais um dos fatores que agravam a pressão inflacionária, independentemente da capacidade de oferta do setor industrial.
Há de se considerar a gigantesca carga tributária sobre a renda das famílias e dos setores produtivos em 34% do Produto Interno Bruto (Pib). Essa carga tributária é incompatível com os desafios de competitividade de um país emergente como o Brasil. Os elevados tributos, de um lado, diminuem o poder de compra das famílias e, de outro, pressionam a inflação de custos, reduzindo a capacidade competitiva dos setores produtivos. Uma reforma tributária ampla já foi tentada anteriormente e não saiu do papel. Esse desejo é impossível no Brasil. No entanto, o Governo Federal encontrou outros caminhos que deverão alcançar os mesmos objetivos: tornar a produção mais competitiva.
Ao zerar a contribuição patronal previdenciária de 20% sobre a folha de pagamentos e adotar uma alíquota fixa em 1% sobre produtos e em 2% sobre serviços, já beneficia 56 setores, que representam 50% do PIB. Ademais, reduzir as tarifas de energia elétrica das empresas foi uma medida importante na redução do custo da produção da indústria. Reduziram-se, também, as tarifas de energia residenciais, possibilitando aumento na renda disponível das famílias. Ao somarmos a desvinculação da taxa de juros da remuneração da poupança, forma-se um conjunto de medidas que possibilitam a redução do custo da produção e do capital do setor industrial. Os aumentos dos investimentos no setor de bens de capital realizados, nos últimos seis meses, refletirão no aumento da produção de bens de capital e do emprego no primeiro semestre deste ano.
A baixa produtividade da mão de obra é um dos componentes da falta de competitividade nacional. Para se ter uma ideia, nos últimos 30 anos, desde 1980, a produtividade da mão de obra dos países asiáticos cresceu 200%, ou seja, 3,70% ao ano, enquanto a brasileira permaneceu estagnada. A baixa produtividade é um freio na redução de preços.
Diante desse conjunto de causas da inflação brasileira, é limitada a eficácia da política monetária em reduzi-la e mantê-la próximo da meta de 4,5% ao ano, por meio da elevação da taxa de juros. Importa frisar que não interessa elevar os juros e promover recessão econômica para que a taxa de inflação fique dentro da meta, como também não se deve permitir inflação acima dos limites da meta. Inflação elevada causa desinvestimentos, queda da produção, redução da capacidade efetiva instalada na indústria e aumento do desemprego.
Em face dos fatores que causam a inflação, no curto prazo, o remédio para conter a inflação será por meio do adiamento de gastos correntes do Governo Federal, até o momento da reversão da taxa de inflação. Essa medida possibilitará um ajuste da demanda à oferta, influindo positivamente nas expectativas dos agentes produtivos. No longo prazo, a redução da inflação e a sustentabilidade do crescimento dependerão de reformas radicais na capacidade produtiva e de produtividade do País.
Nesse sentido, há um alento favorável. O Governo Dilma Rousseff estará implementando um dos maiores programas de investimentos em logística existentes no mundo. Nos próximos quatro anos, o Brasil deverá investir algo em torno de R$ 550 bilhões em uma nova malha ferroviária e rodoviária, hidrovias, portos, aeroportos. Desse total, espera-se que 30% sejam realizados por investidores qualificados nacionais e internacionais.
Esse programa elevará a capacidade competitiva nacional, por meio de um sistema logístico eficiente, promulgando crescimento, estabilidade da inflação e previsibilidade da taxa real de juros. Essa é a arquitetura da nova economia brasileira. Estamos, mais uma vez, diante da possibilidade de retomarmos o crescimento acelerado com pleno emprego, e inflação controlada que marcou a história econômica do País na década de 1970.
Ernesto Lozardo, Professor de Economia da EAESP-FGV
Autor do livro: Globalização – a certeza imprevisível das nações, 2008, segunda edição.